Não bebo para me esquecer de quem sou, simplesmente não sei quem sou, o que sou, o que quiserem. Não bebo sempre, mas são várias as vezes em que bebo e perco o controlo. Procuro a sensação de me perder, porque no fundo é isso que sinto todos os dias como um peso no peito. Procuro perder-me, atingir aquele estado em que as vozes ficam longe, os pensamentos ficam demasiado altos e os sentimentos muito perto. Procuro perder-me na esperança de me encontrar, na esperança de que daquele copo de vinho ou daquele charro emerja o meu ser, a minha pessoa. Porém, a única coisa que surge são frases sem sentido, comportamentos parvos, atos que magoam tudo e todos à minha volta, são vidros partidos e nódoas no corpo, são mãos que me tocam sem eu querer ou saber, são feridas no corpo, memórias turvas, pessoas que se afastam. Tudo o que emerge é errado, é negro, é ao lado; tudo o que emerge é demasiado desadequado, caótico, estúpido para a realidade em que vivo. E, se calhar, tudo o que emerge é tudo o que sou. Daquele copo de vinho eu tinha esperança que surgisse algo de bom, de diferente do que aparentemente sou a cada dia, de diferente daquilo que sinto que é a minha vida; e quando sinto uma réstia de alegria, de ar fresco, quando os pulmões parece que se me enchem e ao mesmo tempo não consigo respirar mais, quando quase me sinto tão feliz que podia morrer assim, é porque tudo o que fiz deitou tudo a perder, é quando percebo que tudo o que sou, não é nada, não vale nada, não passa de uma farsa, de uma hipócrisia. Daquele copo de vinho eu esperava a ilusão de um sonho bom, mas devia simplesmente ter ficado a dormir, na minha cama, sossegada e, se não fosse capaz de melhor, deixar só a vida passar por mim.
Há dias em que sinto que não encaixo em lado nenhum. Mas há outros dias, a maioria dos dias ultimamente, em que gosto de ser assim meia estranha, acho até divertido sentir-me meia deslocada e acho interessante. Sempre achei piada àquelas personagens dos filmes que eram diferentes, de diferentes formas. Mas há sempre aquela personagem que, não sendo super linda e inteligente, nem chamando a atenção de todos por nenhuma razão especial, é uma personagem interessante. Eu gosto disso. E gosto de me sentir assim. Conheçoa algumas pessoas a que eu chamaria de "estranhas" que são assim e eu gosto. Conheço pessoas que parecem "estranhas" mas no fundo não são. Eu gosto de pessoas estranhas, porque são diferentes, cada uma à sua maneira. Pensam por si próprias, desenvolvem ideias, agem e estão com as pessoas sem pensar no que as outras pessoas pensam. Eu gosto disso. Se calhar todos somos estranhos à nossa maneira. Eu gosto deste tipo de estranheza mais do que as outra...
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