Não nos preparam para isto. Nunca ninguém me falou disto e nunca pensei passar por isto desta forma. Mas a verdade é que nas profissões da área social, não é possível ignorar a parte relacional. Aliás, essa é a parte mais importante do nosso trabalho, as relações significativas que criámos com as pessoas, com os utentes ou clientes, como lhes quiserem chamar. São pessoas. Pessoas a quem nos ligamos, de quem gostamos e de quem sentimos saudades. Sim, nem todos os dias são cor-de-rosa e nem sempre saímos do trabalho com um sorrido no rosto. Mas isso não significa que não gostemos dessas pessoas.
Só que ninguém nos prepara para o momento em que temos de sair. Principalmente, quando sair não é uma decisão nossa. É um murro no estômago, e levantam-se tantas questões:
- o que lhes dizer, como lhes explicar?
- quando lhes dizer?
- como ajudar a conter as suas emoções, quando as nossas emoções também estão à flor da pele?
- como deixar para trás anos de relação, de acompanhamento, de crescimento, assim, num piscar de olhos?
É um processo que custa. Não tenho dúvidas que eles se vão adaptar e que continuaram a aprender e a evoluir, sem dúvida. E sei que eu também seguirei em frente, mas a verdade é que não queria. E queria poder dizer-lhes isso "eu não queria ir embora, eu queria continuar convosco". Mas que bem é que isso lhes faria? Pois.
Então, calo-me no meu silêncio. Esperando em segredo que sintam algumas saudades e que recordem um pouco do que lhes tentei transmitir ao longo do tempo que os acompanhei. Espero que não me esqueçam e que me guardem num lugar querido. Mas espero também que se adaptem e que aceitem quem vier a seguir com carinho e alegria.
À medida que escrevo isto, penso que é a mim que me vai custar mais. Lembro todos os momentos com eles, e tudo o que aprendi. Isto parece uma grande treta, mas trabalhar com pessoas é mesmo lindo. E não, não é por sermos psicólogos, ou termos outra formação na área social, que estamos preparados para tudo e que temos que saber lidar com tudo. Somos humanos e sentimos as coisas. E nem sempre estamos bem.
E sim, sair assim de um local de trabalho, de surpresa, na situação atual, deitou-me abaixo. Ainda estou a processar a aceitar o facto de que não vai haver um voltar ao trabalho, não nos vamos voltar a ver tão cedo, de que não vou estar lá para lhes explicar a situação, para os abraçar quando receberem a notícia, para lhes assegurar que não os estou a abandonar e que continuo a gostar imenso deles, de que as coisas que tínhamos planeadas fazer não vão acontecer (e fico a pensar "porque não fiz tudo isto antes?").
Não, ninguém nos prepara para isto. Preparam-nos para os prepararmos a eles e nós achamos que é só isso que é preciso. Até chegar ao momento em que percebemos que nós também precisamos de nos preparar para dizer adeus.
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