Avançar para o conteúdo principal

Crescemos juntos

Digo-lhes constantemente que, é bom focarmo-nos nos aspetos positivos da vida, mas que é importante também dedicarmos tempo a refletir e explorar os sentimentos que consideramos mais desagradáveis. Fechá-los num espacinho pequeno no fundo da nossa mente ou do nosso coração não é solução, digo-lhes. Se os deixarmos lá, sozinhos, eles vão crescer sem regras e sem perceberem que também têm o seu lado bom. E vão começar a sair cá para fora de forma desorganizada, desadequada, por vezes, sem os controlarmos. Lembrem-se, cresceram sem regras: nunca se falou deles, nem com eles. Vamos ter tristeza, medo, frustração, raiva, nojo descontrolados, a passear pela nossa mente, sem nós querermos, e depois vão sair cá para fora sem nos apercebermos, em atitudes reativas e até determinado ponto, inconscientes. Digo-lhes tudo isto, explicando da melhor forma que posso para que eles possam entender a importância de falar destes sentimentos. Dizemos tantas vezes que são sentimentos maus, podemos chamar-lhes o que quisermos. A verdade é que são sentimentos, a verdade é que os sentimentos, a verdade é que precisamos de falar sobre eles, a verdade é que não precisamos nem devemos ter vergonha deles. Digo-lhes tudo isto, tento quebrar algumas barreiras, algumas defesas. É também um risco, porque não sabemos quantas coisas ficaram lá guardadas e durante quanto tempo. Não sabemos de que tamanho serão ou com que intensidade sairão cá para fora. Vamos fazendo progressos aos poucos, aos poucos não me dizem sempre que estão contentes. Por vezes, vão deixando escapar um "hoje estou triste" ou "preocupado" ou "nervoso" e trabalhamos a partir daí. Explorando os porquês, as razões, as origens do que estão a sentir, tentando descascar as camadas devagar. Aos poucos eles vão-se deixando ver, apesar das vergonhas e dos medos. Eles conseguem.
E, às vezes, eu sinto-me hipócrita, com o tanto que exijo deles, porque acredito que são capazes, porque acredito que os pode ajudar... e o tanto que me esqueço, eu própria, de fazer este trabalho interno. De me deixar também sentir e de falar sobre o que é menos agradável, sobre o que dói. Quantas vezes pedimos aos outros algo que não exigimos de nós? Quantas vezes pedimos para ouvirem o que dizemos e não ligarem ao que fazemos? Quantas vezes nos esquecemos que ser um modelo é se calhar, dos aspetos mais importantes? Quantas vezes achamos que somos nós o modelo, tão enganados, pois na verdade, o modelo, o exemplo, são eles. E são eles que nos ensinam e nos guiam. E, se estivermos atentos, tudo isto se torna um ciclo contínuo de autodesenvolvimento em grupo, em que todos nos ajudamos a ser mais e melhor. 
Eu gosto desta visão. Faz-me sentir bem comigo e com o mundo.
Crescemos todos juntos.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Paixão

Sei que a maioria das pessoas diz que a paixão é temporária, o que importa mesmo é que exista o amor verdadeiro e companheiro. Mas, desculpem-me, eu cada vez concordo menos com isto. Cada vez acredito mais que a paixão é realmente importante e completa o sentimento de amor. A paixão é todo o desejo, impulso, fogo que sentimos pelo outro; o amor é mais calmo, mais estável até, por isso é que muitas vezes amamos, só que a paixão não está lá, o que faz com que algo não esteja bem, sentimos que falta algo, sem saber bem o quê. É preciso que se cultive a paixão, que se vá alimentando a fogueira, porque esta paixão foi muitas vezes aquilo que nos fez dar o primeiro passo, atirar de cabeça. Esta paixão foi aquele desejo súbito de estar com o outro, de nos entregarmos, mesmo que sem segurança nenhuma, sem nada que nos dissesse "é para valer" ou "vai dar tudo certo". Esta paixão é a vontade pura e primeira do outro, da sua pessoa e do seu corpo. Acredito que é, frequentem...

a vontade

Às vezes, vem a vontade a vontade de te ver sempre de estar contigo sempre de esquecer que tudo o resto existe e aí, venho embora, e procuro voltar a mim prefiro ter essa vontade aguentá-la,  diluí-la no tempo esticá-la,  fazendo-a durar, do que acabar com ela logo de uma só vez rapidamente, sem pensar e quase sem sentir então escrevo penso, pinto,  sonho,  grito, abraço essa vontade e trago-a comigo lá no fundo do peito como companhia E quando te volto a ver deixo-a sair para a sentir de novo e deixar que me invada e me faça feliz por te ver por te ter por estar contigo  e sentir novamente aquela vontade louca sem sentido de esquecer tudo o resto e sou só ali contigo eu e a vontade e todos os outros sentimentos e sensações e tudo e tudo. Para depois voltar a mim para que possa voltar para ti sem me esquecer de quem sou e de quem tu és independentes um do outro.

Dizer adeus no trabalho

Não nos preparam para isto. Nunca ninguém me falou disto e nunca pensei passar por isto desta forma. Mas a verdade é que nas profissões da área social, não é possível ignorar a parte relacional. Aliás, essa é a parte mais importante do nosso trabalho, as relações significativas que criámos com as pessoas, com os utentes ou clientes, como lhes quiserem chamar. São pessoas. Pessoas a quem nos ligamos, de quem gostamos e de quem sentimos saudades. Sim, nem todos os dias são cor-de-rosa e nem sempre saímos do trabalho com um sorrido no rosto. Mas isso não significa que não gostemos dessas pessoas. Só que ninguém nos prepara para o momento em que temos de sair. Principalmente, quando sair não é uma decisão nossa. É um murro no estômago, e levantam-se tantas questões: - o que lhes dizer, como lhes explicar? - quando lhes dizer? - como ajudar a conter as suas emoções, quando as nossas emoções também estão à flor da pele? - como deixar para trás anos de relação, de acompanhamento, ...