Chove. Chove imenso lá fora. Mantenho-me dentro, no quentinho. A cama é demasiado confortável para sair e não há nada que me chame para a vida cinzenta lá fora. Por isso, fico aqui, no aconchego do edredon que me abraça. E penso ou medito. Deixo os meus pensamentos surgirem e desaparecerem conforme lhes apetece. Em imagens, sons, cores, vozes, cheiros, palavras. Vão e vêm. Tento perceber o que sinto que cada coisa que me surge, mas não as prendo. Tudo flui num misto de realidade, sonho e pensamento, numa espécie de familiaridade estranha. O meu corpo está leve, a minha mente também. Vale a pena dedicar tempo a estar sozinho e aproveitar a nossa própria companhia. Aprendemos a sentir conforto, ao invés da solidão que sentíamos inicialmente, ou que julgávamos sentir. Demorei tempo a saber parar e apreciar estes momentos e, por vezes, ainda me custa. Mas ultimamente cada vez menos. Talvez seja porque estar sozinha me surge agora como uma opção, e não como obrigação, então há uma certa sensação de controlo, de poder. Eu escolho. Quando a mente e o corpo assim me pedem, eu escolho estar sozinha. Ainda que seja sexta-feira à noite, dia de sair, beber um copo e estar com o pessoal. Nem sempre é o que preciso. Por isso, eu escolho.
Continua a chover, mas hoje aceito esta chuva facilmente, enquanto há uns anos atrás um dia assim, era o suficiente para me deixar mal-disposta. Hoje, quando muito deixa-me preguiçosa. Ainda assim, faço o que tenho a fazer.
Olho para a chuva e penso no quanto a vida tem mudado e pensar nisso dá-me uma sensação de melancolia e felicidade. E tento não me apegar ao que a vida é agora, mas aproveitá-la, senti-la com toda a intensidade que posso, abraçá-la e aproveitá-la, tal como é. Todas as mudanças fazem parte de um processo, de um conjunto de momentos, sentimentos e pessoas, que deixam saudades e que me deixam feliz. Seja por tê-los vivido, conhecido, sentido ou por ainda ter o prazer de o fazer atualmente.
Chove lá fora, mas desta vez, como já não acontecia há alguma tempo, não chove em mim.
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